Solteiro ou casado? Namorados!

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Essa é uma pergunta repleta de emoções principalmente na adolescência. Porém crescemos e aprendemos que estamos evoluindo também na vida jurídica e que devemos pensar nas questões pessoais, existenciais, emocionais e patrimoniais ao nos relacionarmos com outras pessoas.

O namoro é aquele momento de frio na barriga, das pupilas dilatadas (brilho no olhar), do coração acelerado, do pensamento focado no outro. Quem já passou por isso sabe o quanto essa relação é capaz de trazer sensações boas. Eu, como advogada de direito de família e sucessões, sempre que converso com as pessoas que buscam elaborar um contrato de namoro, observo o quanto o amor é o centro da experiência humana. Logo, tratar de assuntos em princípio tão delicados e essenciais, seja por escritura pública ou contrato particular, é uma forma de tornar o relacionamento dialogável a fim de facilitar para o amor entre as pessoas tornar-se mais possibilidade, responsabilidade e menos posse.

Cabe ainda ressaltar que o contrato de namoro não objetiva burlar a legislação, mas deixar claro que o namoro é um relacionamento que não possui o objetivo de formar família ou de compartilhar bens e obrigações pelo menos naquele momento. Claro que esse relacionamento pode evoluir e se tornar uma união estável ou casamento, casos esses que poderão contar com contrato de convivência ou um pacto antenupcial que guiarão o novo momento da relação.

Vejo notícias sobre discussões judiciais que perduram por anos em que as partes litigantes esperam por uma decisão judicial sobre seus relacionamentos, se é namoro ou união estável. Eu costumo falar que informalidades não protegem ninguém e processos judiciais como esses poderiam ser evitados se no momento da decisão de iniciarem um namoro, as pessoas conseguissem dialogar para compor a série de combinações de funcionamento para o relacionamento e o momento temporal que ele se insere. Esse contexto não obsta, por óbvio, que em casos de evolução desse relacionamento existam reflexões sobre as combinações/acordos a fim de formalizar uma união estável ou casamento.

Nunca teremos controle sobre os afetos, expectativas e desejos não verbalizados, por isso as combinações acordadas por um contrato de namoro é o que eu chamo de ato concreto de afetividade e maturidade jurídica. Não se trata de controle, mas de um balizador de regras, responsabilidades e expectativas de relacionamento.

  1. O que é contrato de Namoro?

Contrato de namoro é um documento/instrumento realizado de forma particular ou por escritura pública por pessoas capazes, e deve ser pautado pelos princípios da boa-fé (entre as partes e perante a sociedade), autonomia de vontades (liberdade jurídica para contratar, se responsabilizar, obrigar-se ou receber direito), consensualismo (concordância das partes) e a força da obrigatoriedade (o contrato será lei entre as partes). É um documento que deverá ser realizado por advogadas familiaristas com conhecimento e técnicas profissionais de legislação e escuta atenta e afetiva das partes envolvidas.

Neste documento poderá conter disposições de foro íntimo, patrimonial, emocionais e existenciais, desde que não viole a legislação vigente e que as partes estejam de acordo.

Existe um método de reflexão e elaboração para esse documento que deve ser composto pelas partes auxiliadas por advogada de família e sucessões e se necessário com outros profissionais. Aqui no escritório, por exemplo, estabelecemos no mínimo 3 encontros em que ocorrem conversas individuais e conjuntas. Eu utilizo uma técnica que aprendi em um curso que realizei de pós graduação em direito de família e sucessões a fim de ajudar o casal de namorados a ampliar o diálogo e pensar no que é importante para cada um e para eles em conjunto (gosto de dizer pra ti, para mim e para nós). Após alguns exercícios e reflexões (a advogada organiza as escolhas dos clientes), e entramos na parte de legislação, nesse momento é redigida a minuta do contrato de namoro e após isso é verificado se o documento está com todas as disposições de acordo a legislação vigente a fim de resguardar os direitos de cada um e o relacionamento em si.

  1. Por que fazer um contrato de namoro?
  • Deixar claro que desejam namorar e não constituir família (no momento);
  • Preservar questões emocionais e existenciais;
  • Resguardar, dentro do possível e de acordo com o regramento legal, que o namoro não seja suscitado como união estável;
  • Deixar expresso que divisão de contas e compartilhamento de streamings e outros não caracteriza dependência recíproca;
  • Determinar como será o regime de bens se o namoro evoluir para uma união estável e o casal não fizer o contrato de convivência e a escritura pública de união estável;
  • Se os presentes recebidos na constância do namoro serão entregues ou se por exemplo houver um animal de estimação como será a convivência após o seu término;
  • Em caso de término ou falecimento evitar discussões sobre partilha de bens, alimentos/pensões e herança;
  • Afastar direito real de habitação;
  • Outros de acordo com casos concretos.
  1. O Contrato de Namoro possui validade Jurídica?

É importante frisar que não existe dispositivo legal contrário a sua elaboração, entretanto também não há jurisprudência pacificada sobre o tema. Em disputas judiciais outros fatores serão levados em consideração. Alguns tribunais estão decidindo que esse instrumento não deve afastar a união estável se esta ocorre de fato quando, apesar do contrato de namoro, o relacionamento evoluiu para o objetivo de formar uma família. Eu concordo com essas decisões que levam em consideração realmente o que ocorre na prática do relacionamento de fato.

Eu gosto muito do pensamento que circunda o princípio da primazia da realidade, isso significa resumidamente, que o importante são os fatos que realmente acontecem. Logo, o contrato de namoro não deve servir para burlar o direito de outrem, mas sim para determinar uma relação afetiva, contínua, com responsabilidade mútua, mas que na vigência desse relacionamento não pretendem formar família.

A intenção de elaborar documentos como o contrato de namoro não devem ser vulgarizadas, ou seja, não devem ser utilizadas para prejudicar alguém como é o caso de esforço comum na aquisição de bens. Nesse ponto, utilizo minha fala como mulher, em que pese não tenha passado por nenhuma situação nesse sentido, observo que as mulheres ainda são lesadas no término dos seus relacionamentos, principalmente em divórcios e dissoluções de uniões estáveis. É por isso que o contrato de namoro dá espaço para que se dialogue e se reflita sobre isso, para que no momento de aquisição de bens ou outras decisões importantes haja uma nova conversa e repactuação de acordos em função do esforço comum e da intenção de formar uma família.

Tem uma frase de Ruth Beder Ginsburg que gosto muito em que diz: “As mulheres pertencem a todos os lugares onde as decisões estão sendo tomadas.” Reforço, “todos os lugares!” Se você está em um relacionamento, reflita sobre! Devemos entender que o afeto é muito importante, mas esse afeto deve ser racionalizado e ampliado a todos os envolvidos, inclusive você!

  1. Como faço para propor a realização de contrato de namoro?

Confesso que esse questionamento recebido no instagram me pegou desprevenida, pois para nós familiaristas, fica muito claro a importância do diálogo nas relações afetivas e o quanto estas conversas podem e devem permear quaisquer etapas dos relacionamentos afetivos (namoro simples, namoro qualificado, união estável, casamento, término de namoro, dissolução de união estável, divórcio) e o quanto é fundamental trazer a série de combinados desses diálogos para um instrumento jurídico (contrato de namoro, contrato de convivência ou pacto antenupcial). Mas para responder essa pergunta eu fui “a campo” e fiz o questionamento a diversas pessoas conhecidas e entre as respostas observei alguns pontos comuns:

  • Ser sincero e falar sobre as motivações para levar combinados verbais a um contrato de namoro;
  • Explicar o que é um contrato de namoro e o que ele pode trazer de diálogo ao relacionamento;
  • conversar sobre as expectativas: sobre as suas expectativas e escutar as expectativas do outro;
  • Lembrar que é a oportunidade de fazer um contrato customizado para a relação específica;
  • Se dentre os combinados conter temas polêmicos, como por exemplo fidelidade, esforço comum, divisão de despesas, compartilhamento de residência e outros assuntos, conversar sobre o que significa a questão para cada um;
  • Buscar advogadas familiaristas que falam sobre o tema e compartilhar artigos e assuntos relacionados entre vocês;
  • Permitir um tempo de reflexão do outro a respeito do assunto;
  • Proporem, como um presente para ambos, uma consulta jurídica com advogada familiarista para melhor compreender as opções.

Lembre-se que para não repetir padrões sejam nossos ou de nossos familiares é necessário decidir, fazer novas escolhas, e se reconectar consigo mesmo, cultivando o amor próprio, o amor pelo outro e o amor pela sua vida. Para isso, mais uma vez, é necessário dialogar com responsabilidade e ter abertura para escutar o outro(a) com o intuito de pactuar acordos de forma madura e jurídica a fim de evitar que o namoro, se vier a terminar, não vire uma disputa judicial com ações, ameaças ou competição devido a combinados obscuros ou verbais não cumpridos.

Dra. Elizangela Medeiros | OAB-RS113297
Especialista em Direito de Família e Sucessões em Pelotas – Rio Grande do Sul

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🖊️Revisão texto: Luzia Balladares